Ele era terrível.... nada o segurava em um carteira de escola....
Eram só nove anos...mas sempre nos dava a impressão de que não podia perder tempo.
Se sentava, logo queria levantar.... se levantava...logo queria andar...se chegava, estava na hora de sair...e se saísse....já queria voltar...
Tá certo...nasceu de oito meses... mas ele era prá lá de esperto!!!
Nas atividades, sempre superava qualquer criança da sua idade.... começou a engatinhar com seis meses....aprendeu a ler e escrever antes da maioria, amarrava seu próprio tênis desde muito pequeno...e as rodinhas auxiliares da bicicleta, já eram descartáveis em seus quatro anos!!!
E tudo ouvia e sempre tinha uma resposta na ponta da língua, independente do assunto.
Me lembro que quando nasceu sua irmã, em seus seis anos de idade, no primeiro momento em que me viu amamentando-a, já me questionou:
"Mã...o parto foi normal ou de sangue?"
...ehehehehe...e essa frase nos acompanhou durante anos e anos, sempre com muitas risadas....porque ele tinha, naquela época, a língua presa e era muito bonitinho da forma que falava.
Mas lá nos nove anos de idade, com toda aquela interminável energia, seus professores de sala não sabiam mais o que fazer para conter o ir e vir daquele menino tão elétrico; ele não conseguia se manter sentado em sua carteira. Conversava com um amigo aqui, com outro ali, sempre dispersando o assunto em sala de aula. E o que mais irritava os professores: não copia o que era escrito na lousa e muito menos fazia os deveres de casa.
Eu e o pai dele sempre nos fazíamos presente, mas ele era expert em nos enrolar..... sempre minimizava os deveres de casa e à cada semana, novos bilhetinhos dos professores. Mas o mais incrível é que ele era tão esperto que, seu conhecimento devia vir por osmose...ehehehehe, tirava ótimas notas e era sempre um dos melhores alunos da classe. E, por mais hiper-ativo que fosse, por mais que deixasse as professoras de cabelo em pé, ele tinha uma característica que o colocava no patamar das atenções na escola: seu coração!!!
Ele não fazia diferença com ninguém: cumprimentava desde o porteiro, até a diretora, da mesma forma e sempre com um largo sorriso!!! Tinha sempre uma palavra de carinho com todos e era exatamente desta forma que ganhava a admiração de todos, fazendo com que sua forma elétrica de ser, em sala de aula, se tornasse apenas um mero detalhe.
Até que, lá no final daquele ano, 1992, ele foi com o irmão mais velho de 10 anos, em um aniversário de um coleguinha. E como sempre, deixamos os meninos na festinha e fomos passear com a irmãzinha deles. E festa de meninos, tem que ter bola, né?
Ele era apaixonado pelo futebol...dizia que quando crescesse, iria ser jogador de futebol.
E onde tinha uma bola, com certeza tinha meu menininho.....
E, naquele exato momento, ele era o goleiro...e na defesa de um dos lances, a cerca de proteção não aguentou seu corpinho magro e lá se foi ele e a bola, dois metros de altura do chão!!!!
Quando lá chegamos para buscá-los, no horário combinado, uma surpresa inesperada: braço engessado e um susto inestimável. Os próximos dias não foram nada fáceis e meu menininho, tão saudável, teve que passar por uma cirurgia e seu cotovelo ser totalmente refeito!
Já estávamos na segunda quinzena de novembro; faltava pouco tempo para o final do período escolar e entre dias de internação, cirurgia, recuperação e fisioterapia, a escola o dispensou das aulas no final do ano. Fez duas ou três provas para constar nos autos da escola e ele foi promovido!!!!
Afinal, tinha ótimas notas e não seriam quinze dias de aula que o prejudicaria.
Mas como todo garoto esperto, meu menininho usou da inteligência para colocar em prática a malandragem, aquela bem típica de muitos brasileiros...ehehehe
Quando reiniciou o período escolar, no ano seguinte, ele já na quarta séria do ensino fundamental, um coleguinha de classe fez o seguinte comentário:
" Que droga, ter que voltar para a escola... estudar, fazer lição, fazer prova!!!!"
E ele mais que depressa respondeu:
"Que nada, faça como eu: quebre alguma parte do corpo e eles te passam de ano!!!"
Pois é...ele se achou muito esperto...só não se deu conta de que a professora estava ao lado e havia escutado cada letrinha daquela frase tão infeliz!!!!
E infeliz não foi só a frase...acabou sendo toda a sua atuação naquela ano letivo. Começou e continuou o ano com total descompromisso, e claro...suas notas começaram a declinar.
O conteúdo já não era mais tão fácil, as provas mais complexas, as cobranças mais intensas... e ele, nem aí para mudar o comportamento: se garantia achando que seria promovido como nos anos anteriores.
Eu e o pai dele cobrávamos uma postura diferente, dia após dia; mas ele não nos dava atenção. Até disfarçava, mas quando chegávamos nas reuniões de pais e mestres, lá estava a mais contundente prova de que ele não estava se empenhando: notas muito baixas.
E o pior de tudo era que o irmão mais velho dele, com diferença de apenas 15 meses, era um exemplar aluno e, não faltavam elogios vindos dos professores, aliás, vinham até mesmo, comparações!!!
Até que, na última reunião do ano, no início do último semestre, ele havia melhorado nas notas e até ganho pontinhos em função de atividades extras e tarefa de casa. E claro, mais do que depressa, eu quis buscar a cumplicidade da professora, comentando sobre o quanto ele havia melhorado.
Mas, para minha surpresa, ela me respondeu da seguinte forma:
"Realmente mãe, ele melhorou nas notas neste terceiro semestre...mas infelizmente, tarde demais!!!!"
Aquele comentário me caiu como uma pedra de gelo. Eu havia me empenhado tanto para conscientizá-lo da necessidade de mudança em relação aos deveres escolares. Havia até aberto mão de algumas atividades para estar mais próxima dele em casa e poder acompanhá-lo nas tarefas, etc...etc...
E aí vem aquela professora prepotente e sem qualquer perspicácia me dizer que era tarde demais?!?
Não pensei duas vezes: aquela instituição escolar que eu havia escolhido com tantos critérios, que tanto respondia às minhas expectativas em relação ao meu filho mais velho, não moldava-se às necessidades do meu filho do meio...e era hora de mudá-lo de escola.
No ano seguinte, ele inciou o ano letivo em uma outra escola.... mas infelizmente, mesmo com toda a prepotência e despreparo daquela professora, meu menininho foi reprovado.
Não foi nada fácil administrar aqueles três finais de ano tão tensos: fratura do cotovelo, mudança de escola e reprovação. Mas com certeza, aquela etapa nos fez olhá-lo de forma diferente e, consequentemente, tratá-lo de forma diferenciada e não como costumávamos olhá-lo, já que tínhamos um outro filho um ano e pouco mais velho.
Tenho a impressão que, se nada disso tivesse acontecido, a referência sempre teria sido o mais velho e ele, iria na sombra dele...o irmão de, se é que você consegue me entender....
E hoje, ele já com 30 anos, formado e atuando na área de Administração de Empresas e posso dizer, cidadão do mundo, pois seu maior prazer é viajar, foi me acompanhar no Hospital para enfim. decidirmos a sequência do meu tratamento relacionado ao câncer de mama..... e sabe que frase eu escutei ao lado dele:
" Não temos mais tempo".... ou seja, "É tarde demais!!!"
E a frase veio em detrimento ao exame que há dias atrás postei que talvez faria nos Estados Unidos: ONCOTYPE DX ( um exame ainda indisponível no Brasil). Mas três semanas passaram... tentei de várias formas conseguir recursos para fazê-lo... mas infelizmente, agora que consegui a ajuda de alguns amigos para tentar juntar o montante e custear o exame que não sairia menos de U$5.000,00 (aproximadamente R$12.000,00), hoje o médico me posicionou que não podemos mais esperar pois o prazo de seis semanas pós cirúrgico é o limite para iniciar a quimioterapia.... e sem ONCOTYPE DX, há necessidade de fazer químioterapia...pois somente um resultado negativo resultante deste exame, me afastaria de um tratamento quimioterápico.
Então, contagem regressiva para a quimioterapia, que inicia no dia 09 de abril....
Coração apertado.... ansiedade ao extremo e medo...muito medo!!!!
Mas tudo bem..... podemos não ter mais tempo hábil para a realização do ONCOTYPE DX.... mas isso jamais será uma sentença de morte... Porque, por mais que já tenha chorado e por mais receio que tenha dos efeitos colaterais de uma quimioterapia, eu me sinto muito conectada à esta trajetória intitulada VIDA!!!
Quer saber o que eu realmente acredito?!?
Que assim como na vida do meu filho, que precisou chegar no limite do tempo para renascer para uma nova história e novos comportamentos.... assim será comigo: pode ser tarde demais para a realização do tal exame.... mas eu acredito que, depois desta prova, no meu caso, de quimioterapia, eu iniciarei uma nova jornada em minha vida, com valores revisados, aprendizados renovamos e um novo olhar para a vida... porque nada acontece por acaso e absolutamente tudo pode ser aproveitado, principalmente quando a lição vem da dor e nos dá a grande oportunidade de praticar, simplesmente, o amor!!!!!
Independente da sua religião, crença, eu já lhe peço: ore por mim...onde quer que você esteja, eu tenho certeza absoluta: isso fará total diferença em meus próximos dias!!!!
Eterna gratidão..
Bjoks no coração!!!!
Para as coisas importantes, nunca é tarde demais, ou no meu caso, muito cedo, para sermos quem queremos.
Não há um limite de tempo; comece quando quiser. Você pode mudar ou não...não há regras!!!
Podemos fazer o melhor ou o pior; espero que você faça o melhor!!!
Espero que veja as coisas que assustam...espero que sinta coisas que nunca sentiu antes...
Espero que conheça pessoas com diferentes opiniões...espero que tenha uma vida da qual se orgulhe!!!
Se você achar que não tem, espero que tenha a força para começar novamente!!!
(O curioso caso de Benjamin Button)